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Processo vaticano, advogado do Ior: "Visto pelos réus como um caixa eletrônico"

 Foto de arquivo: uma audiência do processo sobre a gestão dos fundos da Santa Sé (Vatican Media)

O processo aberto em julho de dois anos atrás sobre a gestão dos fundos da Santa Sé, retomado após as férias do verão europeu e os pedidos de condenação dos dez réus feitos pela Promotoria de Justiça, continua com as intervenções e os pedidos dos advogados das partes civis. Na audiência número 68, realizada na tarde desta quarta-feira, 27 de setembro, na sala multifuncional dos Museus Vaticanos, o advogado do Instituto para as Obras de

Religião (Ior), Roberto Lipari, falou por mais de quatro horas. O defensor dos interesses do banco vaticano compartilhou os pedidos de condenação feitos pelo promotor Alessandro Diddi e solicitou "a restituição do que foi ilicitamente subtraído" das finalidades do Papa, e uma indenização por danos morais e de reputação ao Ior. Esta quinta-feira é a vez da advogada da Secretaria de Estado e na sexta-feira, 29 de setembro, dos advogados da Apsa e da Asif, enquanto quinze audiências, de 5 de outubro a 6 de dezembro, serão dedicadas às réplicas de defesa dos réus, como lembrou o presidente do Tribunal vaticano, Giuseppe Pignatone.

 

Investimentos especulativos com os fundos do Ior

 

O advogado do Ior começou, pouco depois das 15h, por sublinhar que a acusação do promotor de justiça, concluída em 26 de julho com os pedidos de condenação, "é um corte transversal muito eficaz dos fatos" que são objeto do julgamento, não havendo necessidade de acrescentar mais nada. Ele lembrou que o Instituto para as Obras de Religião, cuja queixa ao promotor de justiça, juntamente com a do auditor geral, desencadeou a investigação sobre a transação do prédio de Londres, havia formado uma ação civil em todas as acusações e para todos os réus.

 

São João Paulo II e os deveres daqueles que trabalham para a Santa Sé

 

E, para fazer entender o desvalor do delito de peculato, imputado a cinco réus, do qual "decorrem os outros delitos", citou a Carta de São João Paulo II, de novembro de 1982, ao seu secretário de Estado, cardeal Agostino Casaroli, sobre os deveres e o espírito de serviço dos funcionários da Sé Apostólica. Para enfatizar que a produção de bens econômicos e lucro não é o objetivo institucional da Santa Sé. "Porque a base principal de seu sustento - concluiu o advogado - é constituída pelas ofertas. O Papa nos diz que a Santa Sé vive da caridade". E qualquer investimento especulativo é, portanto, incompatível com seus propósitos, especialmente porque as contribuições dos fiéis devem ser "usadas somente para os propósitos indicados pelos ofertantes". O peculato objeto do processo "ofendeu todos aqueles que fizeram sacrifícios para doar esses fundos".

 

Os 600 milhões de euros reservados pela Secretaria de Estado

 

Lipari recordou o montante dos fundos à disposição da Secretaria de Estado. Entre 2004 e 2020, o Ior lhe deu contribuições de quase 700 milhões de euros, com depósitos de cerca de 50 milhões por ano: eram depósitos ao Papa e para as necessidades da Sé Apostólica. Portanto, para o advogado do Ior, "era o Papa o único sujeito legítimo para decidir como usar esses fundos, com sua expressa disposição. E para as necessidades da Igreja, suas necessidades urgentes, que certamente não eram a compra do prédio de Londres e outras especulações". No processo, lembrou o advogado, tanto o monsenhor Alberto Perlasca, ex-diretor do Escritório administrativo da Secretaria de Estado e do auditor geral, como testemunhas, quanto o cardeal Angelo Becciu, na época dos fatos substituto para assuntos gerais da Secretaria de Estado, como réu, "confirmaram que o Papa nunca deu nenhuma indicação sobre o uso desses fundos". Esse é o ativo de mais de 600 milhões, explicou Lipari, que o cardeal Becciu disse ter encontrado quando chegou à Secretaria de Estado em 2012.

 

Nenhum controle real sobre o uso dos fundos

 

Um patrimônio enorme, comentou o advogado da parte civil, sobre o qual em 2012 não havia controle, tanto que o cardeal, lembrou Lipari, disse que "estávamos em uma torre de marfim". O próprio Becciu, ao deixar a gestão a cargo de Perlasca e dos réus Fabrizio Tirabassi e Enrico Craso, que era o "semáforo" que autorizava os investimentos, pediu ao financista que avaliasse o investimento de 200 milhões e 500 mil dólares do fundo Athena. O investimento então foi feito, sem nenhum controle real. E sem pedir uma avaliação do Ior, "o único órgão que pode avaliar se um investimento é compatível com o direito canônico", enfatizou o advogado do Instituto.

 

O Ior visto apenas "como um caixa eletrônico"

 

Para Lipari, os réus ligados à Secretaria de Estado, desde o monsenhor Mauro Carlino até Tirabassi, "viam o Ior como um caixa eletrônico, que sempre tinha que responder positivamente às suas solicitações". O advogado do Instituto deu como exemplo o investimento, que mais tarde não foi feito, no petróleo angolano, quando Tirabassi e Crasso pediram financiamento primeiro ao Ubs e depois ao Credit Suisse, mas não ao Ior, "porque sabiam que o Ior não o concederia". Mas o primeiro dos dois bancos suíços renunciou ao negócio e ao investimento "porque era muito arriscado e não estava de acordo com o perfil do investidor, a Santa Sé". Como não o era também o investimento, que foi feito, "em um fundo fechado no qual todo o poder está nas mãos do gestor".

 

A avaliação das infrações penais contra os réus

 

Lipari passou então em resenha primeiro o delito de corrupção e depois o de fraude, citando muitos e-mails, mensagens de whatsapp e minutas impressas contidas nas atas como provas contra os réus. Por fim, o delito de extorsão contra o corretor Gianluigi Torzi e o de abuso de poder, um crime imputado a todos os réus ligados à Santa Sé, incluindo Renè Brülhart, ex-presidente da Autoridade de Inteligência Financeira (FIA) e o diretor Tommaso Di Ruzza. Para concluir, o advogado do Instituto para as Obras de religião lembrou que nesse processo "vimos o uso de instrumentos financeiros nos quais o administrador dos bens eclesiásticos perdia toda a possibilidade de controle e o uso do dinheiro da Igreja sem qualquer controle e precisão. Vimos alguns membros internos da Santa Sé solidarizarem com os extorsionários da própria Santa Sé". E, por fim, "vimos todas as indicações da carta de São João Paulo II serem distorcidas por pessoas que traíram o mandato recebido da Igreja".

 

Pedidos de indenização do Ior

 

Ao final de sua intervenção, às 19h20, o advogado Lipari pediu ao Tribunal que condenasse os réus por todos os crimes imputados e a restituição das somas ilegalmente retiradas da disponibilidade exclusiva do Santo Padre, a serem depositadas no Ior. "A pessoa ofendida pela conduta dos réus - segundo o advogado da parte civil - é, antes de tudo, o Santo Padre", uma vez que foi prejudicada a destinação ao Papa dos 700 milhões de euros fornecidos ao longo dos anos pelo Instituto para os fins do Pontífice e reservados pela Secretaria de Estado. E, finalmente, pediu a liquidação equitativa do dano moral (múltiplo) e do dano à reputação sofrido pelo Instituto para as Obras de Religião, estimado por um relatório de especialistas em 987.494.000 euros.

 

Fonte: Vatican News

 

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